terça-feira, 1 de julho de 2008

Teoria Funcionalista

EM QUE CONSISTE O MÉTODO?

Toda teoria pressupõe um conjunto de regras práticas que identificam o modo de selecionar as premissas teóricas e o modo de apresentar o arcabouço teórico. Vale dizer, a teorização implica em um método de aquisição de conhecimento e em um método de apresentação sistematizada desse conhecimento adquirido. Um conceito geral possível de método é o conjunto de processos e procedimentos, ordenados e coerentes entre si, tendentes a um fim. Esta definição mínima de método é suficiente para explicitar os três elementos básicos: conjunto de processos e procedimentos, ordenação e coerência interna e finalidade. Auguste Comte foi o teórico do positivismo, e fez deste um referencial metodológico, assim como Karl Marx fez o método de análise marxista e o Emille Durkheim fez o funcionalismo, ou O Método Teórico Funcionalista que estudaremos nesta unidade. Na sociologia para se compreender os problemas e as questões sociais é preciso ter método, o método se constitui através de questionamentos e sinalizações teóricas que busquem responder estes questionamentos:
A sociedade como um conjunto de elementos dinâmicos e diferenciados, é movida por questões e problemas. Os teóricos da sociologia e seu campo científico insurgiram para tentar compreender tais problemas que se manifestam na sociedade.


O MÉTODO DA SOCIOLOGIA FUNCIONALISTA

A sociologia funcionalista é hoje uma das mais difundidas nas sociedades capitalistas, em primeiro lugar nos Estados Unidos. O pensamento de Émile Durkheim foi retomado e desenvolvido especialmente por dois sociólogos americanos, Robert K. Merton e Talcott Parsons, sem dúvida os maiores responsáveis pelo desenvolvimento do funcionalismo moderno.
O funcionalismo, ao analisar qualquer elemento de um sistema social, procura saber de que maneira este elemento se relaciona com os outros elementos do mesmo sistema social e com o sistema social como um todo, para daí tirar as conseqüências que interferem no sistema, provocando sua disfunção, ou, por outro lado, contribuem para a sua manutenção, sendo, portanto, funcionais.
Estes conceitos foram desenvolvidos a partir do pensamento de Durkheim, que se esforçou para mostrar a existência própria e independente dos fatos sociais em relação aos indivíduos particulares. Durkheim chamou de consciência coletiva as formas padronizadas de conduta e de pensamento que se observa no interior de um grupo social: "Sem dúvida, é evidente que nada existe na vida social que não esteja nas consciências individuais; mas, quase tudo que se encontra nestas últimas vem da sociedade. A maior parte de nossos estados de consciência não seriam produzidos pelos indivíduos isolados, mas seriam produzidos pelos indivíduos agrupados de outra maneira. Eles derivam, portanto, não da natureza psicológica do homem em geral, mas da maneira segundo a qual os homens, uma vez associados, interagem mutuamente, dependendo de serem mais ou menos numerosos, de estarem mais ou menos próximos. Sendo produtos da vida em grupo, somente a natureza do grupo pode explicá-los"[1][27].
Citando ainda uma vez Peter Berger: "Segundo a perspectiva durkheimiana, viver em sociedade significa existir sob a dominação da lógica da sociedade. Com muita freqüência, as pessoas agem segundo essa lógica sem o perceber. Portanto, para descobrir essa dinâmica interna da sociedade, o método sociológico terá muitas vezes de desprezar as respostas que os próprios atores sociais dariam a suas perguntas e procurar as explicações de que eles próprios não se dão conta. Esta atitude essencialmente durkheimiana foi levada à abordagem teórica hoje chamada de funcionalismo. Na análise funcional, a sociedade é analisada em termos de seus próprios mecanismos como sistema, e que muitas vezes se apresentam obscuros ou opacos àqueles que atuam dentro do sistema"[2][28].
Segundo o pensamento de Durkheim, a função da sociologia “seria a de detectar e buscar soluções para os ‘problemas sociais’, restaurando a ‘normalidade social’ e se convertendo dessa forma numa técnica de controle social e de manutenção do poder vigente”, explica C. B. MARTINS[3][29].
Com efeito, no início do segundo capítulo de seu livro As regras do método sociológico, E. Durkheim define seu princípio metodológico fundamental: "A primeira regra e a mais fundamental é a de considerar os fatos sociais como coisas". Para acrescentar mais adiante, neste mesmo capítulo: "De fato, Comte proclamou que os fenômenos sociais são fatos naturais, submetidos a leis naturais. Reconheceu, assim, o seu caráter de coisas, visto que na natureza só há coisas"[4][30].
Michel Löwy observa que esta abordagem de Durkheim é perfeitamente homóloga à desenvolvida pela economia política burguesa e explica: "É aqui que provavelmente se encontram as raízes do naturalismo positivista enquanto discurso ideológico típico da nova ordem industrial (burguesa)". E, citando Durkheim, no texto La science et l'action, Paris, PUF, 1970, pp. 80-81, Michel Löwy acrescenta que "o próprio Durkheim apresenta a economia política como precursora da démarche positivista nas ciências sociais: 'Os economistas foram os primeiros a proclamar que as leis sociais são tão necessárias como as leis físicas. Segundo eles, é tão impossível a concorrência não nivelar pouco a pouco os preços... como os corpos não caírem de forma vertical.... Estenda este princípio a todos os fatos sociais e a sociologia estará fundada' "[5][31].
Ainda citando Durkheim, M. Löwy mostra que "desde os seus primeiros escritos em 1867, o pensamento de Durkheim exprime com precisão, clareza, coerência e rigor exemplares esta nova função social: 'É ainda ao professor de filosofia que cabe despertar nos espíritos que lhe são confiados a idéia do que é uma lei; de lhes fazer compreender que os fenômenos físicos e sociais são fatos como os outros, submetidos a leis que a vontade humana não pode interromper à sua vontade, e que, por conseqüência, as revoluções no sentido próprio do termo são coisas tão impossíveis como os milagres' "[6][32].
Finalmente, diz Löwy: "Entre as leis naturais da sociedade que seria vão, utópico, ilusório - em uma palavra: anticientífico - querer 'interromper' ou transformar, Durkheim situa com destaque a desigualdade social"[7][33]. Os argumentos estão na obra Da divisão do trabalho social, de 1893: as sociedades "são constituídas, não por uma repetição de segmentos semelhantes e homogêneos, mas por um sistema de órgãos diferentes, onde cada um tem um papel particular, sendo eles mesmos formados de partes diferenciadas". Isto é absolutamente normal, pois se encontra em qualquer organismo, como, por exemplo, "nos animais, [onde] a predominância do sistema nervoso sobre os outros sistemas se reduz ao direito, se se pode falar assim, de receber um alimento mais seleto e de receber sua parte antes dos outros"[8][34]. E ainda: "Pois, se nada entrava ou nada favorece injustamente os concorrentes que disputam entre as tarefas, é inevitável que apenas os que são os mais aptos a cada gênero de atividade a alcancem"[9][35].
O próprio Durkheim não faz segredo do conservadorismo do seu método positivista: "O nosso método não tem, portanto, nada de revolucionário. É até, num certo sentido, essencialmente conservador, uma vez que considera os fatos sociais como coisas cuja natureza, por mais elástica e maleável que seja, não é, no entanto, modificável à nossa vontade"[10][36].
Lendo esta afirmação, Michel Löwy chega, finalmente, ao âmago do problema quando diz que é inútil ficar discutindo, como o fazem alguns sociólogos hoje, quais são os elementos formais e doutrinários do conservadorismo de Durkheim: o seu problema está "na sua própria concepção do método. É seu método positivista que permite legitimar constantemente, através de argumentos científico-naturais, a ordem (burguesa) estabelecida". Isto lhe possibilita passar "sem hesitação das leis da seleção natural às 'leis naturais' da sociedade, e dos organismos vivos aos 'organismos sociais'". O apoio para este enfoque? "A homogeneidade epistemológica dos diferentes domínios e, por conseqüência, das ciências que os tomam como objeto"[11][37].
Raymond Aron, escrevendo em 1966, olha com desgosto para a sociologia funcionalista americana, herdeira deste pensamento, e classifica-a como essencialmente analítica e empírica. Multiplicando questionários para saber como vivem os homens em sociedade, transformando-se, deste modo, em mera sociografia, caricatura de uma autêntica ciência social, ela deixa de ser crítica, no sentido marxista do termo, não questionando a ordem social nos seus traços fundamentais e admitindo implicitamente a visão de mundo da sociedade norte-americana [38].

[1][27]. DURKHEIM, E., De la division de travail social, Paris, PUF, 1960, p. 342 ou em http://gallica.bnf.fr/Fonds_Frantext/T0088267.htm, p. 342.
[2][28]. BERGER, P., Perspectivas sociológicas. Uma visão humanista, pp. 50-51.
[3][29]. MARTINS, C. B., O que é sociologia, p. 50.
[4][30]. DURKHEIM, E., As regras do método sociológico, pp. 94 e 96.
[5][31]. LÖWY, M., As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen, p. 26.
[6][32]. Idem, ibidem, p. 27. Löwy cita o texto de DURKHEIM, E., La philosophie dans les Universités Allemandes, 1866-67, em Textes 3, Fonctions sociales et institutions, Paris, Ed. de Minuit 1975, p. 485. Esta é também a perspectiva funcionalista de Peter Berger, em Perspectivas sociológicas. Uma visão humanista, p. 58, quando diz que "a percepção sociológica é refratária a ideologias revolucionárias, não porque traga consigo alguma espécie de preconceito conservador, e sim porque ela enxerga não só através das ilusões do status quo atual como também através das expectativas ilusórias concernentes a possíveis futuros, sendo tais expectativas o costumeiro alimento espiritual dos revolucionários. Em nossa opinião, essa sobriedade não-revolucionária e moderadora da sociologia é altamente valiosa".


[7][33]. LÖWY, M., As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen, p. 27.
[8][34]. DURKHEIM, E., De la division de travail social, pp. 157-158.
[9][35]. Idem, ibidem, pp. 369-370.
[10][36]. DURKHEIM, E., As regras do método sociológico, em o. c., p. 74.
[11][37]. LÖWY, M., As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen, p. 29. O sublinhado no texto é de Michel Löwy.

3 comentários:

~*~ Beth Pantera ~*~ disse...

Rio de janeiro, 04/04/2009

Percebi q no texto Durkhein e Marx sao totalmente diferentes, com a percepcao d q Durkhein nao gosta mt de Marx pela sua teoria revolucionaria...Li e reli o texto e tive pouco entendimento sobre a teoria de Durkhein, eh conservadora pq ela "conserva" o seu pensamento,(pq ele acha q uma blusa eh verde ela eh verde e ponto final)??

Por que a a teoria de Durkhein eh considerada conservadora ??

Se possivel,evie a explicacao para meu e-mail

beth-filosofa-do-mal@hotmail.com

Se nao tudo bem,obrigada!

Luciano Fr. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luciano Fr. disse...

pelo que entendi ela é conservadora porque não propõe um rompimento na ordem estabelecida, muito pelo contrário, a ideia é de manter uma ordem social.